Categoria Consumidor

EMPRESÁRIO/SOCIEDADE EMPRESARIA E O SEU DIREITO AO CONSUMO

Defesa do consumidor. 3 Teorias, Finalista, Maximalista e Finalista Moderada.

Esse breve artigo, tem o condão de falar um pouco sobre os direitos do empresário/sociedade empresária e o direito do Consumo. Para isso, necessário a definição do “destinatário final” insculpido no artigo segundo do CDC, e a correlação do mesmo com os atos da empresa/sociedade empresária e sua vulnerabilidade. 

O conceito de empresa e empresário está no caput do artigo 966 do Código Civil que determina que “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. Grifo nosso.

O empresário assim organiza a sua atividade, coordenando os seus bens (capital) com o trabalho aliciado de outrem. Eis a organização. Mas essa organização, em si, o que é? Constitui apenas um complexo de bens e um conjunto de pessoal inativo. Esses elementos – bens e pessoal – não se juntam por si; é necessário que sobre eles, devidamente organizados, atue o empresário, dinamizando a organização, imprimindo-lhe atividade que levará à produção. Tanto o capital do empresário como o pessoal que irá trabalhar nada mais são isoladamente do que bens e pessoas. A empresa somente nasce quando se inicia a atividade sob a orientação do empresário.

Para tanto, é fundamental definir o Consumidor (art. 2º caput do CDC). O artigo 2º, “caput”, do Código de Defesa do Consumidor dispõe que: consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Acerca da expressão “destinatário final” nesse conceito, formaram-se na doutrina três teorias, quais sejam: a Maximalista, a Finalista e finalista moderada/mitigada.

O artigo 5º, inciso XXXII da Constituição Federal² e artigo 1º do CDC³ que expõe a grande intervenção estatal, protegendo a relação de consumo, a qual visa dar transparência e harmonia nestas relações.

A relação de consumo engloba necessariamente em uma das partes do contrato, um consumidor, que é, geralmente, a parte mais fraca no desequilíbrio contratual. 

Cláudia Lima Marques e Antônio Herman V. Benjamim defendem a teoria finalista, definindo o conceito de “destinatário final” do art. 2º do CDC:

“O destinatário final é o consumidor final, o que retira o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final fático), aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econômico) e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois ele não é consumidor final, ele está transformando o bem, utilizando o bem, incluindo o serviço contratado no seu, para oferecê-lo por sua vez ao seu cliente, seu consumidor, utilizando-o no seu serviço de construção, nos seus cálculos do preço, como insumo da sua produção.”

(In “Comentários ao Código de Defesa do Consumidor”, 2ª Ed.,São Paulo, Editora Revista do Tribunais, 2006, p. 83/84).

Os finalistas visam delimitar ao máximo, o consumidor final da relação de consumo, propondo que a expressão “destinatário final “seja interpretada de maneira restrita, definindo-o como,”: o destinatário fático e econômico do bem ou serviço seja ele pessoa física ou jurídica

Para esta teoria o empresário seria consumidor se o bem ou o serviço  utilizado não fizesse parte de sua produção.

Com efeito, Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva ao tratar da corrente maximalista, apresenta as seguintes considerações:

Consumidor é quem adquire no mercado de consumo o produto ou serviço; aquele em razão de quem é interrompida a cadeia de produção e circulação de certos bens e serviços, para usufruir ele mesmo, ou terceiro a quem os ceda, das respectivas funções – ainda que esses bens e serviços possam ser empregados, indiretamente, no exercício de sua empresa ou profissão, isto é , ainda que venham a ser interligados, acessoriamente, à sua atividade produtiva ou profissional, coletiva ou individual, voltada ou não para o lucro (destinatário final fático).

(SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Código de Defesa do Consumidor Anotado e Legislação Complementar. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 8).

Pela teoria maximalista, não só se verifica a situação do consumidor que irá utilizar o produto adquirido, para si ou para sua família, ou seja, o consumidor não profissional, mas também, todas as pessoas que adquiriram qualquer produto, na qualidade de consumidor. Para esta corrente, o artigo 2º deve ser interpretado o mais extensamente possível, visando a proteção das relações de mercado, como um todo, nas quais estão envolvidas o fornecedor e o consumidor.

A teoria maximalista não se preocupa se a pessoa física ou jurídica está adquirindo algo ou utilizando um serviço, com o fim ou não de lucro. Para eles, o destinatário final é o destinatário fático do produto.

A simples desigualdade entre as partes não pode levar a interpretação de hipossuficiência. O Código de Defesa do Consumidor utiliza uma técnica em que a priori, aceita a teoria da corrente finalista, no seu artigo 2º, onde expressa que o consumidor é aquele que adquire ou utiliza do produto ou serviço como destinatário final, mas a jurisprudência tem aplicado ambas as teorias em prol do consumidor se verificar a existência de vulnerabilidade do consumidor.

Porém, se for analisada a regra do artigo 2º, isoladamente, o legislador aceitou a teoria finalista, impondo apenas a proteção legal ao consumidor “strictu sensu”, ou seja, o destinatário final de um serviço ou produto

Bom relembrar, que além dos consumidores “strictu sensu”, também foi dada proteção aos equiparados, os quais por determinação legal terão proteção igualitária, como se fosse consumidor final ( Ex. consumidor vulnerável -art. 4,I;  consumidor carente – art. 5,I; consumidor  vítima – art. 17; consumidor ameaçado – art. 29 e; consumidor hipossuficiente- art. 6,VIII).

Por fim, tem entendido também a posição da teoria finalista mitigada/moderada, que admite em determinados casos a aplicação do CDC para os negócios celebrados entre empresários e sociedades empresárias.

Essa terceira corrente foi criada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Trata-se de uma teoria intermediária, que não observa apenas a destinação do produto ou serviço adquirido, levando em consideração, também, o porte econômico do consumidor. Cláudia Lima Marques expõe em sua obra acerca da corrente finalista aprofundada:

A partir de 2003, com a entrada em vigor do CC/2002, parece estar aparecendo uma terceira teoria, subdivisão da primeira – que aqui passo a denominar de “finalismo aprofundado” – na jurisprudência, em especial do STJ, demonstrando ao mesmo tempo extremo domínio da interpretação finalista e do CDC, mas com razoabilidade e prudência interpretando a expressão “destinatário final” do art. 2º do CDC de forma diferenciada e mista.

(MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. São Paulo: RT, 2006. P. 305).

A ministra do Superior Tribunal de Justiça, Nancy Andrighi, descreve muito bem as características da teoria finalista aprofundada ou teoria finalista mitigada:

CONSUMIDOR. DEFINIÇAO. ALCANCE. TEORIA FINALISTA. REGRA. MITIGAÇAO. FINALISMO APROFUNDADO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇAO. VULNERABILIDADE. (…) a jurisprudência do STJ, tomando por base o conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 29 do CDC, tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às pessoas jurídicas, num processo que a doutrina vem denominando finalismo aprofundado, consistente em se admitir que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço pode ser equiparada à condição de consumidora, por apresentar frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, do CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumidor. 4. A doutrina tradicionalmente aponta a existência de três modalidades de vulnerabilidade: técnica (ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo), jurídica (falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor). Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional (dados insuficientes sobre o produto ou serviço capazes de influenciar no processo decisório de compra). 5. A despeito da identificação in abstracto dessas espécies de vulnerabilidade, a casuística poderá apresentar novas formas de vulnerabilidade aptas a atrair a incidência do CDC à relação de consumo. Numa relação interempresarial, para além das hipóteses de vulnerabilidade já consagradas pela doutrina e pela jurisprudência, a relação de dependência de uma das partes frente à outra pode, conforme o caso, caracterizar uma vulnerabilidade legitimadora da aplicação da Lei nº 8.078/90, mitigando os rigores da teoria finalista e autorizando a equiparação da pessoa jurídica compradora à condição de consumidora (…).

(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 3ª Turma. Recurso Especial nº 1195642. Relator: Nancy Andrighi. Brasília, 21 de novembro de 2012. Disponível em: <http://www.jf.jus.br/juris/unificada/Resposta>. Acesso em: 10 set. 2019).

Verificou-se, assim, que existem três teorias destinadas a explicar o significado da referida expressão: a finalista pura, a maximalista e a finalista mitigada. Os finalistas defendem uma aplicação restritiva das normas de proteção do consumidor, enquanto os maximalistas defendem uma aplicação ampliativa do CDC. Já a terceira corrente, a finalista mitigada/moderada, é intermediária.

PERGUNTAS

PERGUNTA 1.

Uma sociedade empresária do ramo alimentício contratou serviços de instalação de softwares no seu estabelecimento, depois de insistência dos próprios fornecedores, num marketing arrojado de vender o produto. Após pago o preço do serviço, antecipadamente, o fornecedor não executou o serviço e declarou não ser possível a realização por eventos ocasionais, não devolvendo o dinheiro investido.

Pergunta-se. O empresário teria proteção consumerista mesmo utilizando-se para sua atividade laborativa?

O empresário ou a sociedade empresária tem se socorrido cada vez mais da proteção
consumerista em face da situação em que se encontra com vulnerabilidade.

Neste caso, muito embora se trata de uma relação em que a pessoa contratou os serviços para a sua própria atividade, a justiça conferiu o direito ao consumidor, pela teoria finalista moderada.
Senão vejamos.

  1. AQUISIÇÃO DE SOFTWARE DESENVOLVIDO E COMERCIALIZADO PELA EMPRESA RÉ. VULNERABILIDADE TÉCNICA DA CONTRATANTE. 1. Configurado o inadimplemento do contrato, impõe-se a rescisão do respectivo instrumento contratual, nos termos do CCB 475. 2. Caracterizada a vulnerabilidade técnica da contratante relativamente ao software desenvolvido e comercializado pela contratada, justifica-se a aplicação das normas do CDC – de acordo com a Teoria Finalista Mitigada -, ainda que a aquisição do produto tivesse como objetivo o incremento de suas atividades, e não sua utilização como destinatária final.

(TJ-DF – 20090110270495 DF 0070715-83.2009.8.07.0001 (TJ-DF). Data de  publicação: 26/04/2018).

2) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC/73)- AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO – EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO – INSURGÊNCIA DA EMPRESA RÉ.1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que, restando incontroversa a qualidade de consumidora da empresa demandada, porquanto destinatária final dos produtos/serviços contratados – software para gerenciamento de suas atividades empresarias – lhe é facultada a escolha do foro competente para melhor exercer seu direito de defesa.

2. Impossibilidade de se aferir, na presente esfera recursal, a existência de abusividade tida como inserta em cláusula contratual de eleição de foro, ante o enunciado contido na Súmula nº 7 deste Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo interno desprovido.

(Superior Tribunal de Justiça STJ – AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL : AgInt no AREsp 465974 SP 2014/0014127-8).

PERGUNTA 2.

Um empresário locou um imóvel para exercer o seu negócio e conforme acordado no contrato, fez por conta própria diversas benfeitorias, aceitas pelo locador. Terminada a locação, o locatário queria reter o imóvel até receber os valores das benfeitorias, o que não foram acatadas pelo dono do imóvel. Neste caso, aplicamos a legislação civil ou consumerista¿

A relação jurídica em questão deve ser observada sob a ótica da lei especial de locação não residencial artigo…xxx. Neste caso, o empresário, sentindo-se prejudicado quanto as benfeitorias que foram executadas devem ser apuradas por meio do juízo cível e não se admite a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Neste caso, deve o empresário produzir provas em seu favor.

Neste Sentido, temos:

1) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO INDENIZATÓRIA – CONTRATO DE LOCAÇÃO – CDC – INAPLICABILIDADE – ALAGAMENTO CAUSADO POR SOBRECARGA EM REDE DE ESGOTO – NEXO CAUSAL AUSENTE. – O Código de Defesa do Consumidor não pode ser aplicado a relações jurídicas estabelecidas com base em contratos de locação, para as quais há legislação específica, qual seja a Lei 8.245 /91 – O ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito – Ausente nexo de causalidade e culpa pelo dano, resta afastada responsabilidade do réu pelos prejuízos sofridos pelo autor.

(TJ-MG – Apelação Cível AC 10702150140185001 MG (TJ-MG). Data de publicação: 09/09/2019)

2) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. 1. AUSÊNCIA DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2. INAPLICABILIDADE DO CDC. LEGALIDADE DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ALTERAÇÃO. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. 3. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC⁄2015, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar contradição existente no julgado, o que não ocorre na hipótese em apreço. Não há vício de fundamentação quando o aresto recorrido decide integralmente a controvérsia, de maneira sólida e fundamentada.

2. Reverter a conclusão do Tribunal local para acolher a pretensão recursal quanto à inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso concreto e à legalidade das cláusulas contratuais demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos e a análise e interpretação de cláusulas contratuais, o que se mostra inviável ante a natureza excepcional da via eleita, consoante enunciado das Súmulas n. 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo interno improvido.

(STJ. AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.054.822 – RJ 2017⁄0029788-8. RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE.  20 de fevereiro de 2018)

     

CONSUMIDOR EQUIPARADO: A PROTEÇÃO ESTENDIDA DO CDC

Esse breve artigo, tem o condão de mostrar que todo aquele que não participou da relação de consumo, não adquiriu qualquer produto ou contratou serviços, mas sofreu algum tipo de lesão pode invocar a proteção da lei consumerista na qualidade de consumidor equiparado, o que a doutrina vem chamando de bystander.  

O consumidor está disciplinado pelo artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor, conforme segue:

“Art. 2º – Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único – Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”.

Por este conceito atribuído pela lei, existe uma discussão doutrinária a respeito do que se entende por Destinatário Final. O Código de Defesa do Consumidor conceitua o consumidor como aquele que adquire ou utiliza do produto ou serviço como destinatário final, isto é, irá utilizar o bem ou o serviço sem colocar na sua produção.

Por sua vez, no artigo 17 do CDC é expresso que são equiparáveis ao consumidor todas as vítimas do evento, caso tenha havido um vício ou defeito do produto ou do serviço, objeto do consumo. Desta forma, a vítima não necessita ser o consumidor “strictu sensu”, mas terá tutela legal por determinação do artigo 17 do Código de Defesa do Consumidor que o equipara ao consumidor.

Conforme explicou a ministra do STJ Dra. Nancy Andrighi no REsp 1.125.276, o conceito de consumidor não está limitado à definição restritiva contida no caput do artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), devendo ser extraído da interpretação sistemática de outros dispositivos da Lei 8.078/90.

Surge então a figura do consumidor por equiparação, ou bystander, “inserida pelo legislador no artigo 17 do CDC, sujeitando à proteção do CDC também as vítimas de acidentes derivados do fato do produto ou do serviço. Em outras palavras, o sujeito da relação de consumo não precisa necessariamente ser parte contratante, podendo também ser um terceiro vitimado por essa relação”, afirmou a Ministra.

O artigo 29, caput, também equipara aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não e que estejam expostas às práticas comerciais estabelecidas nos Capítulos V e VI do Código de Defesa do Consumidor.

De acordo com este artigo, basta a exposição às práticas comerciais nele previstas para que o consumidor seja caracterizado e a sua proteção invocada por meio de vetos a publicidades enganosas e abusivas ou a práticas comerciais conflitantes com o Código de Defesa do Consumidor, tais como a venda casada ou promoções comerciais realizadas por grandes varejistas ou fabricantes de bens de consumo (por exemplo, concursos promocionais com distribuição de prêmios).

Conclui-se pela leitura do parágrafo único do artigo 2º, do artigo 17 e do 29 do CDC, que as pessoas, físicas ou jurídicas, equiparadas a consumidores, têm em comum a inexistência de COLETIVO, BYSTANDER, DE OFERTA relação direta com os fornecedores, mas que podem, mesmo potencialmente, serem lesadas por práticas comerciais abusivas. Inexistem contratos celebrados diretamente entre eles. E é justamente este o intuito do CDC, proteger aqueles que não tenham adquirido o produto ou serviço, mas que estejam expostos aos seus efeitos.  

O Superior Tribunal de Justiça apontou alguns casos, como o Piso molhado, Cacos de vidro na via, Tiroteio na rua, Explosão em bueiro, Derramamento de petróleo, e indicando os julgados e processos:REsp 1125276AREsp 1076833REsp 1000329REsp 1574784REsp 1732398REsp 589789CC 132505CC 143204.

PERGUNTA

Uma pessoa pode ser lesada muito embora não tenha sido o consumidor direto na relação de consumo previsto no artigo 2º do CDC. O empresário pode ser sujeito de direito em razão de não ter tido a proteção devida para tanto. Um motociclista que desenvolve suas atividades empresariais, pode ser sujeito de uma relação de consumo?

RESPOSTA

Sim. A figura do bystander admite que uma pessoa, inclusive, empresário possa ser

beneficiada da relação consumerista.

“Agravo de instrumento. Indenizatória fundada em acidente de trânsito. Queda de motociclista após fios caídos enroscarem em pneu. Defeito do produto ou serviço que caracteriza o autor como “bystander”, nos termos do art. 17 do CDC. Impossibilidade de denunciação da lide. Inteligência dos artigos 88 e 13 do CDC. Decisão mantida. Agravo improvido. (Agravo de Instrumento nº 2000402-57.2017.8.26.0000; 34ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, VU, Des Rel Soares Levada. J. 8/3/2017).

PRÁTICA ABUSIVA PERANTE O CONSUMIDOR

Cláusula de fidelização. Novo entendimento dos Tribunais.

Esse breve artigo, tem o condão de mostrar a definição que o Código de Defesa do Consumidor – CDC trouxe para pratica abusiva, bem como o rol exemplificativo de práticas abusivas que são vedadas nas relações de consumo. E, igualmente, mostrar que a clausula de fidelização é licita (segundo entendimento jurisprudencial), contudo, a cobrança da multa deve obedecer parâmetros. 

Cediço, que o histórico de supremacia do fornecedor fez com que o CDC pudesse criar um equilíbrio entre os dois polos contratuais (contratante e contratado). E o Código consumerista, estabeleceu em seu artigo 39, vedações abusivas pelo fornecedor, a saber:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

II – recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;

III – enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;

IV – prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

V – exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

VI – executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes;

VII – repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos;

VIII – colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro);

IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais;                  (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

X – elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços.                (Incluído pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

XI –  Dispositivo  incluído pela MPV  nº 1.890-67, de 22.10.1999, transformado em inciso  XIII, quando da conversão na Lei nº 9.870, de 23.11.1999

XII – deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.              (Incluído pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

XIII – aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido.            (Incluído pela Lei nº 9.870, de 23.11.1999)

XIV – permitir o ingresso em estabelecimentos comerciais ou de serviços de um número maior de consumidores que o fixado pela autoridade administrativa como máximo.                   (Incluído pela Lei nº 13.425, de 2017)

Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.

A PRÁTICA ABUSIVA em sentido amplo, é a desconformidade com os padrões mercadológicos de boa conduta em relação ao consumidor. Nesse sentido amplo, trata-se de qualquer comportamento que atende contra a boa-fé objetiva. E tal como definida, percebe-se que a prática assim se amolda à ideia de abuso de direito, vedada pelo Direito Civil que o considera modalidade de ato ilícito em seu art. 187.  

Quanto ao momento em que se manifestam no processo econômico, as práticas são produtivas ou comerciais. Nesse sentido, podem ser:  

a) práticas abusivas pré-contratuais: antes da conclusão do contrato; Exemplo é o que acontece quando o fornecedor coloca produto à disposição por meio de venda casada; ou quando limita o número de produtos que podem ser adquiridos (art. 39, I, CDC – É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I – condicionar o fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos).  

b) práticas abusivas no termo dos contratos: aquelas presentes no próprio conteúdo do instrumento contratual; usualmente por meio de cláusulas abusivas. E por ai já se percebe a distinção entre prática abusiva (termo mais amplo) e cláusula abusiva (modalidade de prática abusiva). É exemplo a cláusula que exonera o fornecedor, previamente, de qualquer responsabilidade referente à defeito/vício do produto ou serviço.  

c) práticas abusivas na execução do contrato: naqueles contratos em que a execução não é imediata, prolongando-se no tempo, é possível que o fornecedor deixe de atender requisitos impostos pelo sistema. Por exemplo, o empreiteiro que, durante a realização da obra, deixa de informar o cliente/consumidor acerca do andamento da empreitada.  

d) práticas abusivas pós-contratuais: são as que se manifestam após a execução do contrato. Veja-se que o contrato, a relação contratual, se extingue, mas seus efeitos não. Correto dizer, assim, que em nosso atual sistema, os efeitos contratuais não se exaurem com o fim do contrato. Persistem, desta forma, os deveres decorrentes dos princípios de boa-fé e lealdade (bem como da visão da relação obrigacional como processo). No campo do consumo, é exemplo a vedação para o fornecedor de repassar informação depreciativa referente ao consumidor no exercício de seus direitos (art. 39, VII, CDC) ou, ainda, a obrigação de prestar informações e esclarecimentos mesmo depois da venda.  

No que pese a Cláusula de fidelidade, a pergunta que se faz, é legal? Para exemplificar, trazemos à baila o atual posicionamento quanto a clausula de fidelização cobrada pelas operadoras de Telefonia Móvel.

Isto porque, considerando a enorme quantidade de linhas telefônicas no pais, atualmente, muitos consumidores questionam se as cláusulas de fidelidade constantes nos contratos de prestação de serviços de telefonia móvel são legais !!!

A resposta é positiva, pois não há ilegalidade neste tipo de previsão, conforme tem entendido os tribunais pátrios.

Neste sentido temos,

  1. COBRANÇA DE MULTA DE FIDELIDADE, POR QUEBRA DE CONTRATO DE TELEFONIA. DECISÃO QUE INDEFERE PLEITO DE EXCLUSÃO DO NOME DA AUTORA DE CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. INSURGÊNCIA DA AUTORA. ALEGAÇÃO DE QUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. INSUBSISTÊNCIA. OPERADORA QUE APRESENTOU, COM A CONTESTAÇÃO, CONTRATO DE PERMANÊNCIA CELEBRADO EM JULHO/2017, COM CLÁUSULA DE FIDELIZAÇÃO DE 24 MESES, A TÍTULO DE CONTRAPRESTAÇÃO PARA CONCESSÃO DE “DESCONTO DIFERENCIADO”. AUTORA QUE CONFIRMA A PORTABILIDADE DE LINHAS TELEFÔNICAS MÓVEIS EM OUTUBRO/2017. PLAUSIBILIDADE DO DIREITO NÃO DEMONSTRADA. RECURSO DESPROVIDO.

“[. . .] firme a jurisprudência do STJ de que a chamada cláusula de fidelização em contrato de telefonia é legítima, na medida em que se trata de condição que fica ao alvedrio do assinante, o qual recebe benefícios por tal fidelização, bem como por ser uma necessidade de assegurar às operadoras de telefonia um período para recuperar o investimento realizado com a concessão de tarifas inferiores, bônus, fornecimento de aparelhos e outras promoções” (REsp nº 1445560/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16/6/2014).

(TJ-SC – Agravo de Instrumento Blumenau 4030444-75.2018.8.24.0000. Publicação: 29/08/2019);

  • SERVIÇODE TELEFONIA MÓVEL. CLÁUSULA DE FIDELIZAÇÃO. PERÍODO DE PERMANÊNCIA MÍNIMA. MULTA CONTRATUAL. VALIDADE. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. 1. Carece de interesse recursal a parte que se insurge contra matéria de que não foi sucumbente no juízo a quo. 2. É lícita a cláusula de fidelização em contrato de telefonia, na medida em que se trata de condição que fica ao alvedrio do assinante, que recebe em troca benefícios, além de assegurar às operadoras de telefonia um período mínimo para recuperar o investimento realizado com a concessão de tarifas inferiores, bônus, fornecimento de aparelhos e outras promoções. Precedentes do STJ e do TJGO. 3. Comprovado que o consumidor não observou sequer o período mínimo de permanência do contrato de 12 (doze) meses, é válida a cobrança da multa contratual pelo descumprimento da cláusula de fidelização. 4. Impõe-se a inversão, por inteiro, dos ônus sucumbenciais, quando um litigante decair de parcela mínima da pretensão. Inteligência do art. 86 , parágrafo único , do CPC . 5. APELAÇÃO CÍVEL PARCIALMENTE CONHECIDA E PROVIDA.

(TJ-GO – Apelação (CPC) 01173400220178090051. Publicação: 28/01/2019).

Todavia, os consumidores devem ficar atentos, pois a multa, caso queiram rescindir o contrato antes de terminado o prazo de fidelidade não é devida, se o serviço não foi prestado adequadamente.

  1. Serviço de telefonia móvel. Contrato que contempla cláusula de fidelização. Resolução antecipada de acordo devido a cobrança de valores diferentes dos pactuados. Prestadora de serviços que agiu com desídia por mais de ano e não resolveu o problema com o cliente. Descumprimento contratual caracterizado, que torna a multa rescisória indevida. Recurso desprovido.

(TJ-SP – Apelação Cível AC 10091978020188260664. Publicação: 17/06/2019).

  • EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – PLANO CORPORATIVO DE TELEFONIA MÓVEL – RELAÇÃO CONSUMO – APLICAÇÃO CDC – ENCERRAMENTO DO CONTRATO ANTES DO TÉRMINO DA FIDELIZAÇÃO – FALHA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS POR PARTE DA EMPRESA DE TELEFONIA – MULTA FIDELIZAÇÃO – PREVISÃO CONTRATUAL IMPOSTA SOMENTE AO CONSUMIDOR – INTERPRETAÇÃO NO SENTIDO DE CONFERIR IGUAL RESPONSABILIDADE À PRESTADORA DE SERVIÇOS – MULTA DEVIDA. Aplicando-se a teoria finalista mitigada, é de consumo a relação entre a empresa que firmou contrato de prestação de serviços de telefonia e a empresa de telefonia contratada. A aplicação de multa por rescisão antecipada da avença somente em desfavor do consumidor fere o princípio da boa-fé objetiva e da equidade, pois confere ao fornecedor posição contratual superior à experimentada pelo consumidor.

Assim, a fim de equalizar a posição contratual entre as partes contratantes, a clausula de fidelização em contrato de telefonia, prevista exclusivamente em favor da prestadora de serviços, deve ser aplicada em favor do consumidor, uma vez comprovada a falha de prestação de serviços por parte da empresa de telefonia.

(TJ-MG – Apelação Cível AC 10079099703229001. Publicação: 23/11/2018)

Outrossim, deve ter havido, no momento da contratação, um benefício em favor do consumidor, como por exemplo, descontos na aquisição do aparelho telefônico ou no valor da mensalidade. Ou seja, a ausência desses benefícios, em relação a outras modalidades de planos, não permite que a clausula de fidelização seja exigida.

PERGUNTA

A Empresa FIELTELECON atua no ramo de telefonia móvel. Em seus contratos, insere a chamada cláusula de fidelização por meio da qual os seus clientes, para obterem descontos nos seus planos e na aquisição de aparelhos celulares, devem permanecer pelo menos 12 meses com o serviço contratado. Neste período, caso haja desistência por parte do consumidor, incidirá multa de 50% do valor que seria normalmente pago até o fim da vigência. Esta prática pode ser considerada abusiva? Por que?

RESPOSTA

A questão é polêmica. Eram, basicamente, duas formas de ver: primeiro, no sentido de que há liberdade contratual para as partes assim reger suas relações; segundo, afirmando-se que em se tratando de contrato de adesão, a medida seria abusiva. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, e os Tribunais pátrios, veem decidindo no mesmo sentido a questão, e aceitando a fidelização, desde que dela decorressem efetivos benefícios para o consumidor, tais como: custo reduzido para a realização de chamadas, abono em ligações de longa distância, baixo custo de envio de short message service – SMS etc.

“É firme a jurisprudência do STJ de que a chamada cláusula de fidelização em contrato de telefonia é legítima, na medida em que se trata de condição que fica ao alvedrio (livre vontade) do assinante, o qual recebe benefícios por tal fidelização, bem como por ser uma necessidade de assegurar às operadoras de telefonia um período para recuperar o investimento realizado com a concessão de tarifas inferiores, bônus, fornecimento de aparelhos e outras promoções”, pontuou a decisão de um dos casos (STJ. REsp 1445560).